Um decreto do presidente Lula (PT) dobrou o limite do valor que pode ser pago como taxa de administração a organismos internacionais em contratos com o governo.
Cerca de seis meses após a mudança, a Organização dos Estados Ibero-Americanos para Educação, a Ciência e a Cultura, entidade próxima à primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, teve a chance de se beneficiar da nova regra.
A entidade e o governo brasileiro assinaram em setembro um contrato visando aos eventos do G20.
A OEI executou esse projeto em novembro, quando o G20 se reuniu no Rio de Janeiro para a sua cúpula anual.
Um dos eventos produzidos pela OEI foi um festival de música no Rio que ficou conhecido como "Janjapalooza" - a referência ao festival Lollapalooza irritou a primeira-dama.
O decreto também ampliou o leque de serviços que podem ser prestados por esse tipo de organização.
Essa flexibilização vai na contramão do que já julgou o TCU (Tribunal de Contas da União).
Além do Janjapalloza, festival cujo nome oficial é Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, a OEI organizou dentro do G20 o evento Cúpula Social.
Para realizar o festival, a entidade contratou a agência Terruá, que tem entre seus clientes o Banco do Brasil. O gasto e a taxa de administração cobrada ainda não foram informados pelo governo federal ou pela OEI.
O Ministério da Cultura informou à Folha de S.Paulo que o cachê de cada artista contratado seria de R$ 30 mil - o total estimado seria então de R$ 870 mil.
A estatal Itaipu Binacional e a Prefeitura do Rio de Janeiro também contribuíram com patrocínio de R$ 15 milhões cada -ao todo, cinco estatais patrocinaram os eventos.
A OEI recebeu R$ 146 milhões apenas no atual governo Lula. A maior parte do valor foi para parcerias com o Ministério da Educação (R$ 53 milhões).
O decreto publicado derrubou o teto de 5% de taxa para projetos com organismos internacionais. Esse teto havia sido imposto pelo próprio Lula em 2004, durante o seu primeiro mandato.
Agora, a taxa passou a ser de até 10% dos recursos repassados pela União especificamente para o G20, a COP30 (Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas) e a Cúpula dos Brics.
Essa mudança vai na contramão de jurisprudência do TCU.
Em 2010, um acórdão do tribunal de contas relatado pelo ministro Augusto Nardes considerou irregulares acordos com organizações internacionais para a realização de serviços de natureza comum que poderiam ser contratados pelo governo brasileiro.
O UOL procurou a assessoria de imprensa da Presidência da República, que encaminhou a demanda para o Ministério da Cultura.
No dia 3 de janeiro, após a publicação da reportagem, o governo enviou uma nota de esclarecimento ao UOL.
No texto 0o governo afirmou ter sido obrigado a alterar o teto, visto que as taxas praticadas pelos organismos internacionais em acordos de apoio técnico ficam "acima de 8%", discordou que ele esteja em desacordo com as orientações dos tribunais de contas, e destacou que, além da OEI, "outras 16 entidades internacionais foram convidadas para participar do G20. Dessa forma, não houve qualquer favorecimento da OEI para produção das atividades relacionadas ao evento".